Aparentemente, o projeto da anistia aos envolvidos nos eventos do 8 de janeiro mudou de rota. A matéria, que ganhava espaço na Câmara dos Deputados nas últimas semanas, parece agora destinada a ser guardada durante um tempo, em alguma gaveta. Os motivos são claros.
Em primeiro lugar aparece a figura do presidente da Casa, deputado Hugo Motta (Republicanos/PB), que tem o poder institucional de incluir a matéria na pauta e tem sido pressionado por aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) - mas não só - a realizar esse movimento. A questão é que o comandante da Câmara se sentiu incomodado com o tratamento recebido no ato do domingo, 6 de abril, na Avenida Paulista. Deixando evidente seu posicionamento, ele afirmou que o tema será tratado com a “seriedade que merece”, mas que o país tem outras prioridades e que existem projetos mais importantes e urgentes para serem discutidos.
Essa posição de Motta está em linha com a do presidente do Senado Federal, Davi Alcolumbre (União Brasil/AP), que havia se manifestado de maneira similar tempos atrás.
Outro motivo para o esfriamento da anistia está nos números apresentados pela mais recente pesquisa do DataFolha. De acordo com o levantamento, divulgado segunda-feira, 7 de abril, 56% dos entrevistados são contrários a perdoar aqueles que tomaram parte nos eventos na Praça dos Três Poderes, enquanto 37% defendem a medida. Outros 6% não souberam responder e 2% não têm interesse no assunto.
Em paralelo, o Supremo Tribunal Federal (STF) sinaliza afrouxar as penas de diversos envolvidos que estão sendo julgado pela Corte. O ministro Alexandre de Moraes, relator da ação, em nova leva de denunciados, já votou em dezesseis casos (de um total de dezessete) e indicou penas alternativas a todos. Ele propôs penas de um ano de reclusão e prestação de serviços comunitários, participação em curso sobre Estado e democracia, multa, proibição do uso de redes sociais e retenção do passaporte. Uma decisão mais branda quando comparada a outros julgamentos do caso. Bandeira branca para apaziguar os ânimos.
Por sinal, a defesa do abrandamento da dosimetria das penas - diferente de anistia ou absolvição - é feita até por parlamentares de esquerda, como o deputado Chico Alencar (PSOL/RJ), que se manifestou sobre a questão. Ele citou o caso da cabeleireira Débora Rodrigues dos Santos, que pode pegar quatorze anos de prisão. Outros pares têm a mesma posição.
Por fim, o ambiente é de crítica por parte de muitos integrantes do Centrão. Na avaliação desse grupo, Bolsonaro ainda tem capital político, mas teria dado um “tiro no pé” ao permitir que o pastor Silas Malafaia fizesse pesadas críticas ao presidente da Câmara durante o evento na Paulista. Também há o entendimento que o PL sairia ainda mais fortalecido com a aprovação da anistia, o que incomoda aos demais partidos.
A Câmara tenta retomar as atividades ordinárias e, essa semana, apreciará uma série de propostas ligadas ao Judiciário. Como se sabe, a agenda legislativa é extensa e complexa e o impasse em torno da anistia é ruim para todos.
André Pereira César
Cientista Político