Maduro e a tentação autocrática - Política - Hold Assessoria

Maduro e a tentação autocrática

“Banho de sangue” e “guerra civil” caso não seja reconduzido à presidência da Venezuela. Com essas palavras, a máscara de Nicolás Maduro caiu em definitivo, e o autocrata clássico assumiu o palco.

O governo Lula (PT) sempre apoiou Maduro. Defendeu o fim da suspensão do vizinho no Mercosul, retomou a embaixada brasileira em Caracas e mediou as relações entre o governo venezuelano e a oposição naquele país, e também com outras nações. Suficiente? Não.

Os fatos são claros. Autocrata que é, Maduro joga apenas para si - e para manter seu grupo no poder. A recente escalada retórica contra Brasília - que atingiu o ápice após duras e surpreendentes críticas de Lula - ao afirmar que o sistema eleitoral brasileiro é “não auditável” e que Lula deveria tomar “chá de camomila”, passou dos limites da diplomacia que sempre permeou as relações entre os dois países. Sendo claro, ele assumiu o discurso da direita bolsonarista. E colocou o governo brasileiro em uma saia justa.

O comandante da Venezuela, hoje, pode estar queimando importantes pontes no continente, e o definitivo isolamento regional parece cada vez mais claro. Na comunidade internacional, restarão a ele a Rússia e a China, atores que estão sempre de olho nas reservas de petróleo. Pode ser pouco.

Afinal, quem é Maduro? Cria de Hugo Chávez, assumiu o poder em 2013, após a morte de seu guru. Maquinista e sindicalista, sua gestão desde o início foi marcada pelo forte declínio socioeconômico do país, com a criação de ondas de refugiados venezuelanos - o Brasil é uma porta de entrada. Hiperinflação e miséria são a tônica do cotidiano da população, muito, diga-se, em decorrência dos diversos embargos impostos pelos Estados Unidos ao país - também de olho nas reservas de petróleo - ao longo desses anos.

Para se entender melhor o líder venezuelano, alguns fatos. De acordo com o jornalista e especialista em América Latina Ariel Palacios, Maduro chegou a passar noites dormindo ao lado do caixão de Hugo Chávez. Mais ainda, afirmava ver sempre o perfil do “padrinho” nas montanhas ao redor de Caracas - e foi co-criador da oração “Chávez nosso”. Por fim, defendeu a distribuição de coelhos em favelas para conter a fome no país e tentou antecipar as celebrações de Natal para “derrotar a amargura” popular. Populismo bufo.

Em artigo publicado no jornal O Estado de São Paulo na terça-feira, 23 de julho, o ex-embaixador Rubens Barbosa desenha cenários para a Venezuela. Segundo ele, a vitória de Maduro nas eleições de domingo próximo ocorreria, em larga medida, por fraude. Já em caso de êxito da oposição, a transição pode ser dificultada pelo grupo hoje no poder. Além disso, o pleito pode ser suspenso, com o reforço da ameaça de guerra civil e potencial invasão da região de Essequibo, na Guiana. Por fim, contestações de parte a parte dos resultados eleitorais seriam inevitáveis. Em resumo, o quadro no país é delicado.

A rigor, a Venezuela tem um Parlamento e um Judiciário ativos - embora controlados pelo governo, importante ressaltar -, eleições e a população pode deixar o país sempre que desejar. Maduro se utiliza desses fatos para defender seus interesses e afirmar que o país não vive sob um regime ditatorial.

Mas, a tentativa de Maduro de se perpetuar no poder, com diversas e seguidas emendas à Constituição e com o controle dos meios de comunicação, Judiciário e Parlamento, dizem o contrário.

O saldo final do imbróglio ainda não é conhecido, mas o governo Lula, eterno apoiador de Maduro, está em situação no mínimo desconfortável. Nem mesmo a presença do assessor especial Celso Amorim, que deverá acompanhar o pleito, resolverá a situação. Planalto e Itamaraty erraram em suas avaliações e agora precisarão trabalhar para conter os prejuízos.

André Pereira César

Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni - Consultor Jurídico

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