A conversação - Política - Hold Assessoria

A conversação

Cansado da saga do “Poderoso chefão”, Francis Ford Coppola produziu e dirigiu, em 1974, o clássico “A conversação”. Com Gene Hackman como protagonista, o filme conta a história de um paranóico especialista em vigilância que tem uma crise de consciência quando suspeita que o casal que ele está espionando será assassinado.

O que isso tem relação com a política brasileira nos dias atuais? Simples - e não se trata de assassinato, por favor. Falamos aqui das conversas do então presidente Jair Bolsonaro (PL) com Alexandre Ramagem (PL/RJ), à época em que este último ocupava o cargo de diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Conversas pouco republicanas, diga-se.

Aos fatos. A reunião ocorreu no dia 25 de agosto de 2020. Na segunda-feira, 15 de julho último, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes derrubou o sigilo da gravação, encontrada em um aparelho eletrônico de Ramagem.

Além de Bolsonaro e do então diretor da Abin, estavam na sala o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno, e duas advogadas do senador Flávio Bolsonaro (PL/RJ), filho do ex-presidente. Segundo a Polícia Federal, logo após essa reunião em que foram discutidas as investigações da Receita contra o senador por suposta "rachadinha", agentes da Abin passaram a espionar a vida de auditores do fisco em busca de "podres" desses profissionais.

Trata-se de informação grave, que pode comprometer ainda mais a já complicada situação do ex-titular do Planalto. Em linguagem direta, o grupo tentou se utilizar da máquina do Estado em benefício próprio. Na prática, temos um novo escândalo, que começa a repercutir na imprensa.

Além da reunião ter ocorrido no Palácio do Planalto, a utilização da Abin e do GSI para defender o senador evidenciam o modus operandi do grupo que ocupava o poder - a fronteira entre o público e o privado era simplesmente ignorada. A questão que vem à tona é uma só: foi um caso isolado ou outros eventos similares ocorreram ao longo da gestão Bolsonaro?

É claro que os aliados e os muitos apoiadores do ex-presidente negarão os fatos e reforçarão a tese de que, hoje, a máquina estatal inventa mentiras para denegrir a imagem da família Bolsonaro. Quanto à imprensa, ela sempre estará “vendida”. Aqui, nada de novo.

“A conversação” foi uma excelente obra de ficção. As conversas entre o então presidente da República e Ramagem, por outro lado, além de serem bem reais, tem todas as cores de uma comédia de baixo nível. A conferir os próximos capítulos.

André Pereira César

Cientista Político

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