O planeta em compasso de espera - Economia - Hold Assessoria

O planeta em compasso de espera

O partido de oposição é a mídia. E a mídia, porque é burra e preguiçosa, só pode ficar em uma coisa por vez. Tudo que precisamos fazer é inundar o terreno. Todo dia nós jogamos três coisas. Eles vão morder uma, e conseguiremos fazer as nossas coisas. (…) Esses caras nunca, nunca conseguirão se recuperar (…)”.

A frase, proferida pelo ideólogo trumpista Steve Bannon em 2019, recuperada recentemente pelo jornal New York Times e replicada pela ombudsman da Folha de São Paulo, Alexandra Moraes, ajuda a entender o quadro atual vivido pelo planeta. O republicano Donald Trump, apoiado por seus aliados, coloca em prática políticas que afetam a todos, de norte a sul e de leste a oeste, instaurando um clima de incertezas e caos. A rigor, as lideranças globais, e também a imprensa e setores organizados das sociedades, não têm instrumentos tão ágeis, pelo menos até agora, para enfrentar essa nova realidade. O mundo segue em um (tenso) compasso de espera.

Abaixo, uma lista de exemplos do que vem ocorrendo nas últimas semanas.

. Uma das primeiras medidas de Trump após tomar posse, em 20 de janeiro último, foi retirar os Estados Unidos do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas. O negacionismo do presidente republicano fica evidente, pois os dados oficiais divulgados recentemente

dão a informação de que o mês de janeiro de 2025 foi o mais quente de toda a série histórica e que novas ondas de calor deverão ser mais frequentes em todo planeta.

. Igualmente a Organização Mundial de Saúde (OMS) foi objeto de ataques do norte-americano, que anunciou a retirada do órgão. No caso, ele defende mudanças na estrutura da entidade, incluindo o comando nas mãos dos Estados Unidos. Importante lembrar que o país é o principal financiador da OMS.

. Acompanhando os movimentos de Trump, o argentino Javier Milei anunciou a saída do país da OMS e criticou duramente a “agenda ecológica” atual, sinalizando que poderá deixar também o Acordo de Paris. Milei transformou a Argentina num laboratório libertário, com decisões radicais e sem medir consequências futuras.

. Surpreendendo a muitos, o presidente dos Estados Unidos anunciou o esvaziamento da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID), maior agência de assistência humanitária do planeta. A entidade conta com cerca de dez mil funcionários e Trump pretende reduzir esse número a menos de trezentos, na prática inviabilizando as atividades. O republicano segue o raciocínio do empresário e colaborador Elon Musk, que afirma que o órgão promove a “agenda woke”.

. Por falar em Musk, o bilionário dono do X e da Tesla, na condição de chefe do Departamento de Eficiência Governamental, tentou acessar dados sensíveis do sistema de pagamento do Tesouro do país, como os salários de milhões de pessoas. A Justiça Federal estadunidense, por ora, barrou a polêmica iniciativa.

. Também foram registrados atritos entre os governos norte-americano, colombiano, mexicano e canadense. No caso da Colômbia, o presidente Gustavo Petro

cedeu para evitar sanções econômicas e migratórias. Já México e Canadá negociaram um acordo temporário para evitar a aplicação imediata de sanções.

.  Sobre a China, houve uma escalada nas tensões entre os dois países, com ameaças de retaliações de parte a parte. Os presidentes Trump e Xi Jinping terão uma conversa em breve em busca de algum entendimento. Enquanto ela não vem, a China anunciou tarifas que devem atingir US$ 14 bilhões em mercadorias dos EUA, além da investigação do gigante Google.

. O republicano anunciou a mudança do nome de Golfo do México para Golfo da América. Medida inócua na prática, que serve apenas para agradar seu eleitorado.

. As ameaças contra o Canal do Panamá e a Groenlândia, por outro lado, não saíram do papel. No entanto, o governo dos EUA conseguiu que o contrato de administração de parte do canal do Panamá com a China

não fosse renovado.

. A União Europeia também se manifestou sobre os últimos eventos. A presidente do Parlamento Europeu, Ursula Von der Leyen, manifestou apoio ao Tribunal Penal Internacional (TPI) após as sanções impostas pelos Estados Unidos à Corte. Von der Leyen declarou que a "Europa sempre vai defender o direito internacional" e que o tribunal "deve ser capaz de prosseguir livremente na luta contra a impunidade global". Clima ruim entre aliados históricos.

. Outra questão especialmente delicada diz respeito ao conflito entre Israel e o Hamas. Trump propõe a retirada da população palestina da Faixa de Gaza e a entrega do território aos israelenses após o fim da guerra. A sugestão não foi bem recebida pela comunidade internacional, em especial o mundo árabe, que se prepara para contestar a proposta.

. A deportação de imigrantes ilegais segue gerando ruídos e o anunciado entendimento com o presidente salvadorenho Nayib Bukele, que afirmou aceitar deportados de outras nacionalidades em seu país, foi alvo de críticas.

. Por fim, Trump anunciou a taxação de 25% sobre a importação do aço e alumínio. O Brasil, como um dos maiores exportadores, deverá ser seriamente atingido.

. O resumo da ópera é claro. Placas tectônicas estão em movimento e algo pode estar em mutação na ordem mundial. Bannon, em sua declaração citada no início do artigo, fala em “inundar o terreno”. Em seus primeiros atos, Donald Trump pode estar colocando essa ideia em prática.

André Pereira César

Cientista Político

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